Revista de Psicofisiologia, 2(1), 1998

Sobrevôo: da ontogênese, passando pela infância e se detendo na velhice

3) REFLEXÕES SOBRE O ENVELHECIMENTO

O envelhecimento se caracteriza por algumas perdas das capacidades fisiológicas dos órgãos, dos sistemas e de adaptação a certas situações de estresse. Tal fenômeno é universal, progressivo, na maioria das vezes irreversível e resultará num aumento exponencial da mortalidade com a idade, bem como mais probabilidade de doenças. No entanto, a grande disponibilidade alimentos, os conhecimentos de uma alimentação balanceada, da necessidade de exercícios físicos constantes e das vantagens de se viver em um ambiente saudável, além dos progressos da medicina, têm levado a subverter este conceito e aumentar a longevidade.

Mais do que em qualquer época da vida, a pessoa idosa é um todo. Os problemas somáticos podem refletir dificuldades psicológicas e vice-versa. Nada é inócuo.

Apesar disso, no interior de uma mesma espécie, como no ser humano, os indivíduos vão apresentar freqüentemente caminhos variáveis no momento e na progressão do seu envelhecimento. Certos fatores externos não influenciam igualmente a diferenciação do envelhecimento: o clima, a profissão, a poluição, o meio sócio-cultural, as radiações, a nutrição etc. Enquanto, no próprio organismo, o envelhecimento dos diversos sistemas fisiológicos também não é sincrônico, uma vez que suas involuções não começam ao mesmo momento, nem atingem a mesma intensidade, resultando graus diferentes de senilidade.

Este envelhecimento diferencial envolve preferencialmente os órgãos efetores e resulta de processos intrínsecos que se manifestam a nível dos órgãos, dos tecidos e nas células.

Assim, a pele, sujeita a mais intempéries, lesões e radiações, envelhecerá mais rápido e mais precocemente que o fígado, por exemplo. As complicações vasculares afetarão o sistema cardíaco principalmente, e serão prevalentes nas pessoas de mais de 65 anos, em conseqüência da arteriosclerose acumulada pela má alimentação, pelo estresse, possível contaminação bacteriana etc, mas poderão ocorrer mais cedo ou mais tarde de acordo com os hábitos prevalentes e a resistência orgânica especifica.

O estudo da biologia e da fisiologia do envelhecimento demonstra claramente a dificuldade em se distinguir o envelhecimento primário normal e inevitável, do secundário, patológico e potencialmente reversível. Será que aconteceria o mesmo em relação ao declínio psicológico e social que os acompanha? Por quê algumas pessoas envelhecem mais rápido que outras? Será que podemos aprender coisas novas mesmo estando velhos? Não seria possível preservar uma boa saúde mental e uma melhor integração social até o fim da vida?

Tais questões trarão respostas diferentes, que só poderão ser entendidas de acordo com a história de vida de cada um. Nisto reside toda a riqueza do contato com o idoso.

A velhice acarreta situações como:

  • Afastamento da atividade profissional,

  • Queda do poder aquisitivo pela aposentadoria,

  • Possibilidade de viuvez,

  • Solidão do casal dependente dos filhos quando de seus casamentos ou afastamentos,

  • Necessidade econômica e/ou de saúde de morar com os filhos, passando a uma situação de grande dependência, as quais dificultam as relações sociais,

  • Carência de respeito e carinho que lhe eram anteriormente dedicados,

  • A jubilação é comumente aplicada, preconceituosamente sem discriminação dos que ainda são capazes daqueles que não o são, independentemente mesmo da criatividade, que é um mito atribuído aos mais jovens,

  • Um regime de inatividade forçada é imposto, produzindo no idoso bem conservado um sentimento de frustração e uma vulnerabilidade especial para enfermidades psíquicas etc.

Estes fatores operam também como agentes ativadores no processo de envelhecimento e intensificam as mudanças negativas no âmbito da inteligência, do caráter e da vitalidade. Assim, o homem quando envelhece pode perder a sua identidade social, a sensação de poder e atividade, de auto-estima e de sentimento básico de valorização de si mesmo.

Adler é ainda atual na sua assertiva: de que aquilo que o homem mais precisa é sentir seguro em seu amor próprio. Quando o idoso se depara com a realidade intrínseca de uma condição ignóbil, os problemas de adaptação podem se multiplicar.

Basicamente, o idoso caminha pari passu ás diversas gerações, distintas da sua sob todos os aspectos. Uma estrutura de condições sociais e de papéis, de costumes e regras de comportamento muitas vezes inaceitáveis podem tornar-se incompreensíveis para ele.

Contrariando o pressuposto que o idoso é abandonado pelos familiares, percebemos que alguns os superprotegem, limitando ainda mais o seu espaço.