Revista de Psicofisiologia, 1(1), 1997

A dor e o controle do sofrimento (II)

5) ANALGESIA E HIPERALGESIA

Analgesia é a abolição da sensibilidade à dor sem supressão das outras propriedades sensitivas, nem perda de consciência.

A dor ortodoxa pode ser considerada como um mecanismo de proteção do organismo contra lesões. Ela é geralmente aversiva, o que gera uma grande urgência no sentido de evitá-la, e produz comportamento de fuga da situação em que ela está presente.

A preservação do organismo tem na dor seu mais eficaz mecanismo de preservação do ponto de vista neurofisiológico, pois gera respostas de evitação mais permanentes. Ela é para o cérebro, a informação mais "clara"de que o organismo deve está sendo lesado, gerando um comportamento de evitação da dor.

Existem indivíduos com ausência de sensibilidade à dor, que pode ser genética ou adquirida. A nível de seleção evolutiva, essa característica tende a gerar a extinção das espécies deficientes na percepção, uma vez que é extremamente prejudicial ao organismo. Ao nível do indivíduo com analgesia há tendência à morte prematura.

Podemos citar como exemplo, casos de sujeitos portadores do Mal de Hansen, onde 95% das lesões do organismo advém da incapacidade de sentir dor. Esta analgesia ocorre em função da Mycobacterium leprae, agente causador deste mal, que lesa as fibras finas impedindo a transmissão do estímulo doloroso.

Nos casos citados no livro "Deus sabe que sofremos", onde um portador de Hanseníase teve os pés deformados por usar sapatos que lesavam seus pés, mesmo percebendo visualmente que os pés estavam sendo lesados, ele se recusava a usar outro tipo de sapato pois, sem a dor, essa percepção não era suficientemente discriminativa para gerar um comportamento de preservação do organismo.

Pessoas portadoras dessas deficiências têm grande dificuldade em se adaptar à vida cotidiana pois, sensações dolorosas com função adaptativa e de alarme contra estímulos agressivos não são percebidos por elas, ou apenas percebidos parcialmente.

Assim, essas pessoas que não sentem dor acrescentam graves agressões à quaisquer lesões que vir a sofrer e muitas vezes são vítimas de quadros clínicos drásticos que geralmente levam à morte precoce desses pacientes.Uma destas formas é de origem genética chamada analgesia congênita.

Hiperalgesia é o aumento da sensibilidade aos estímulos nociceptivos.

Por exemplo, na síndrome de Lesch-Niehman, geralmente registrado em crianças que dificilmente chegam à vida adulta, ocorrem períodos de auto-mutilação motivados possivelmente pela sensação de dores intoleráveis. Em casos de avulsão do plexo braquial, normalmente em decorrência de acidentes automobilísticos ou de motocicletas, observa-se quadros de paralisia e insensibilidade acrescidas de uma sensação de dor em queimação. Esta dor em queimação ocorre devido ao seccionamento, na mesma altura, no local da lesão, das fibras finas e das fibras grossas- sendo que as fibras finas dispersam mais do que as grossas no nível da entrada da medula, inervando segmentos da medula que impossibilita a inibição da dor pelo mecanismo do portão. Isto também ocorre no caso da dor do membro fantasma.