Ruídos em níveis tão baixos quanto 50 dB já produzem despertares nas ondas cerebrais do tipo variação de freqüência, aparecimento de ondas alfa ou beta por alguns segundos durante o sono e aumento da sensação de ter dormido mal. Vários autores verificaram que o nível de 40 dB(A) deve ser considerado uma linha de base a partir da qual começa o incômodo subjetivo do sono (Griefahn, 1986).
O ruído médio de 52 dB(A), no período noturno nas residências, reduz cerca de 40% da parte mais nobre do sono (sonho e estágios lll/lV). O sono fica em estágios mais superficiais, sem acordar necessariamente a pessoa, e reduzindo a eficiência de sua função. Estes resultados foram constatados no sono de habitantes próximos ao aeroporto de Los Angeles, em vigência de vôos noturnos e na ausência desses e na França, no sono de habitantes próximos a uma autopista antes e após a abertura do trânsito (Friedmann et al, 1.973; Vallet et al 1975 a e b; Terzano et al, 1990). Pessoas de 35 anos que dormiam com nível de ruído de 52 dB(A) na proximidade do aeroporto de Rossy em Paris tiveram o sono degradado como se tivessem 55 anos de idade (CERNE, 1979).
Níveis de ruído tão baixos como 45 dB(A) de pico podem aumentar de 7 a 15 minutos a latência do sono e a fadiga durante o dia (Ohrstrom, 1993). Redução na duração do sono REM inicia-se a partir de 45 dB(A) acompanhados a seguir por mudanças de estágio, aumento de latência para dormir, movimentos do corpo, etc. (Suzuki et ai , 1.993).
Em três trabalhos distintos, Muzet et al.(1.973), Lukas et al. (1.972) e Vallet et al (1.977). constataram que pessoas, com média de idade 22, 51 e 40 anos expostas a um valor médio de pico de 94, 70 e 60 dBA, respectivamente, apresentavam mudança do estado de sono de 37,7, 21,7 e 12% e efetivo despertar 12,3, 27,0 e 2,3%, respectivamente. Colocando-se em gráfico esses dados, verifica-se um crescimento exponencial da reatividade de EEG e despertares com o nível de pico de ruído, embora com o tempo para haver uma pequena habituação em questão de dezenas de dias (Mouret and Vallet, 1.992). Mas, a longo prazo não há habituação.
Modificações da estrutura do sono induzidas por aumento dos níveis de perturbação acústica em indivíduos normais, de média de idade de 25,8 anos, foram pesquisadas por Terzano et al (1.990). Ele encontrou também micro-alterações eletroencefalográficas que aumentavam seu número de ocorrências à medida em que aumentava-se a pressão sonora já a partir de 40 dB(A) à qual eram submetidos os indivíduos durante o período de sono. Essas alterações receberam a denominação de cyclic alternating pattern (CAP). Houve correlação linear entre o aumento da pressão sonora e o aumento na relação CAP/NREM. Também houve correlação linear significativa entre crescentes níveis de pressão sonora e aumento no número de despertares após início do sono, aumento no tempo total de sono no estágio 2, redução no tempo total de sono nos estágios 3/4 e 4, aumento no tempo total de sono NREM e redução no tempo total de REM, redução no tempo total de sono, aumento no número de mudança de estágios e aumento no tempo total de CAP. Este conjunto de dados permite caracterizar a superficialização do sono dos indivíduos participantes do estudo. Ainda nesse estudo encontrou-se correlação linear negativa significativa entre o percentual de CAP/NREM e a apreciação subjetiva da qualidade do sono.
Por tudo isto, a Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT, 1.987), seguindo instruções da Organização Mundial de Saúde (OMS), recomenda o nível médio de 40 dBA para hospitais, salas de aula, bibliotecas e residências. A OMS concluiu que as pessoas perdem o conforto auditivo a partir de 50 dBA e começam a ficar estressadas a partir de 55 dBA (WHO, 1980).
Tarnopolsky et al (1.979) e Braz et al (1987) estudaram a validade do uso de questionários na comunidade. O último autor encontrou os seguintes valores de sensibilidade e especificidade, respectivamente: 89%e 84% para detecção das queixas de insônia, 86% e 89% para as queixas de sonolência excessiva e 92% e 49% para as de parassonias. Para a amostra geral os valores foram 70%e 75%.
Strauch e Meier (1988) realizaram um estudo longitudinal sobre a necessidade de sono em adolescentes através da aplicação de 6 questionários, sendo 1 a cada intervalo de 2 anos. Concluíram que uma substancial proporção de adolescentes têm uma grande dificuldade em adaptar-se à redução do tempo total de sono que ocorre na adolescência.
Muitas vezes, os resultados obtidos da prevalência dos distúrbios e queixas do sono na população em geral não são passíveis de comparação devido a metodologia utilizada. Alguns métodos utilizados são: inclusão em censos demográficos de questões do sono , interrogatórios específicos sobre o sono, levantamento dos casos de centros especializados e investigações objetivas quanto a uma ou mais queixas em populações como trabalhadores, idosos, alunos de graduação e outros.
A avaliação do sono é variável e depende da queixa que o paciente apresenta, além do fato das pesquisas seguirem protocolos diferentes, conforme seus objetivos. lnformações das características do EEG do sono, os estudos clínicos que estudam os fatores que o influenciam, as características clínicas e estudos da prevalência de alguns sintomas podem nos levar a diagnósticos e métodos de tratamento de vários distúrbios (Braz, 1.988, Kales et al., 1.984).
Estudos com trabalhadores de turno e notumo "in situ", considerados à primeira vista, por leigos, bem adaptados, revelaram que aos distúrbios de sono produzidos por ruídos diurnos produzem sérios distúrbios na saúde (Gomes 1.989). Há uma disfunção orgânica ligada a distúrbios do sono com dessincronização no funcionamento fisiológico do organismo (Rutenfranz et al, 1989). Uma explicação parece ser ligada à perda do sono profundo não REM e sobretudo de sono REM, que restabelece as funções mentais e psicológica, não favorecendo os restabelecimentos metabólico e da fadiga orgânica. Uma parcela substancial dos problemas do sono desses trabalhadores ocorre devido aos fatores sociais do meio perturbador, principalmente o ruído diurno, que geralmente é mais elevado (Fruhstorfer et al, 1.984,1.985). Distúrbios do ruído no EEG e nos estágios do sono diurno foram também confirmados em vários laboratórios, mesmo que a pessoa se pense acostumada (Mouret et Vallet, 1987; Terzano et ai, 1.990; Nicolas et ai, 1993).
Ao nível de Lmax=55 dB(A) produzidos de 14 a 64 vôos por noite já se eleva Lmax de 30% significativamente a secreção de adrenalina, atingindo 60% com Lmax=75dB(A) assim como aumento no estágio 1 e redução no estágio lV do sono (Maschke et al, 1993) e em 45 dB(A) há uma queda significativa da qualidade subjetiva do sono (Vallet et al, 1983; Ohrstrom, 1993 b; Suzuki et al, 1993). Para Leq=68 dB(A) Lmax=80dB(A) há aumento significativo de adrenalina e noradrenalina e não de cortisol em crianças submetidas a barulho de avião (Hygge et ai, 1.993). Entretanto, entre 65 e 72 dB(A) de picos noturnos durante passagem de 50 vôos ou passagem de caminhões não se observou aumento significativo de adrenalina e noradrenalina (Carter et ai. 1.993).
A exposição a níveis elevados de ruído conduz o indivíduo a diferentes níveis de estresse. Cantrell (1.974) submeteu 20 jovens de média de idade 20,7 anos a 60 dias de ruído branco de 50 e 70 dB(A) de fundo, de dia e de noite, respectivamente, com 3% do tempo de pico tonal médio de 85 dB(A), o que não deve ultrapassar 52 e 71 dB(A) em média. Ocorreram aumentos médios de 25% no colesterol, precursor na formação de esteróides e 68% no cortisol sangüíneo. Tafalla e Evans (1.993) encontraram aumento de 10% nos níveis de cortisol na associação barulho e exercício físico.
Muitos efeitos psicofisiológicos e fisiológicos durante a exposição ao ruído podem ser considerados como decorrentes da atividade simpática e hipotálamo-hipofisária secundária a uma reação geral de estresse. Para Seyle (1.959) estresse significa uma síndrome geral de adaptação, ou seja, um conjunto de reações sistêmicas e não específicas que surgem quando ocorre uma exposição do organismo a agentes agressores.
A primeira fase (estresse agudo) caracteriza-se por uma resposta do SNA simpático com liberação de catecolaminas. A segunda fase (estresse crônico) representa um período de resistência onde o organismo habitua-se ao agente agressor. Nesta fase o eixo hipotálamo-hipófise-adrenal coordena a resposta hormonal através da liberação de cortisol. A terceira fase (fase de exaustão) corresponde ao período pre-agônico, com presença de falência orgânica múltipla. O organismo não mais possui capacidade de adaptação frente a uma situação de estresse intenso ou muito prolongada (Henry, 1.993).
O índice de estresse psicológico mostrou baixar significativamente a defesa imunológica, como aliás previa-se de todo estresse crônico, aumentando a ocorrência de infecções de garganta e gripe (Cohen et al, 1.991; Altena and Beersma, 1.993; Bly et al, 1 . 993).
A estrutura temporal do sono se repete entre as fases, chamadas lentas e de sonho, que acontecem cerca de 5 vezes a cada noite. Nas primeiras 4 horas há um predomínio dos estágios lll e lV (Carskadon et ai, 1.989; Reimão,1.990), onde ocorre uma grande recuperação da fadiga orgânica e metabólica de todas as células, devido principalmente ao aumento das atividades dos hormônios de crescimento e tireotrópico (Chapon et al, 1972; Cipola Neto 1989).
A fase dos sonhos, que é essencial na recuperação das funções mental e psicológica, predomina nas últimas 4 horas e pode ser prejudicada quando a duração do sono é encurtada (Carskadon et ai, 1.989; Reimão,1.990). Sonhar mais pode até levar à melhor aprendizagem e processamento das informações adquiridas durante a vigília (De Koninck et al, 1989, Wilson, 1.990). A fragmentação do sono prejudica a fase dos sonhos, porque o seu ciclo recomeça do início, resultando prioridade para a fase NREM em relação à dos sonhos. Acordar várias vezes crónica e diariamente pode levar à desestruturaçào rápida do sono de uma pessoa, devido à sua superficializaçào pela privação dos estágios lV e V, a ponto de levá-la à depressão ou a outras perturbações intelectuais e psicológicas (Agnew et al, 1.967; Kleitman, 1.973; Jouvet, 1.977; Mouret et Vallet, 1987; Cipola Neto et al, 1989; Belojevic, 1.993).
Por outro lado, a interferência do nível de ruído
no sono de pacientes hospitalizados ainda não foi bem estudada.
Por isto, o nosso objetivo é avaliar, numa amostra de pacientes
em pré-alta, de dois hospitais, de diferentes níveis de ruído,
por técnica de questionário, a qualidade subjetiva do sono
e seus distúrbios, características e alterações
dos desempenhos físico e cerebral em vigília. Correlacionar
com os níveis de pressão sonora, com o nível de cortisol
urinário de 24h e com dados pessoais.