A POLUIÇÃO SONORA EM BELO HORIZONTE


Pedro Alcântara de Souza Alvares
Engenheiro Mecânico-UFMG
Responsável pelo Laboratório de Acústica, CETEC/MG, 1979-89
Técnico da Brandt-Meio Ambiente
Fernando Pimentel-Souza
Professor Titular de Neurofisiologia-UFMG
Membro Pleno do Instituto de Pesquisa sobre o Cérebro,
UNESCO-PARIS
Engenheiro-ITA, MSc Eletrônica-ENSA-Paris
C.P. 2486 - Depto. de Fisiologia e Biofísica
ICB - UFMG
30.161 - Belo Horizonte
Tel.: (031) 448.1219 - Fax: (031) 441.0835
SUMMARY: NOISE POLLUTION IN BELO HORIZONTE CITY.

The urban noise, especially indoors in schools and in a hospital, were recorded in Belo Horizonte city. They trangressed the city law 4034/85, edict 5893/88, and were away from ABNT recommendations and auditive wellbeing, invading the dangerous band of noisy stress (Cantrell, 1974; WHO, 1980; Sapolsky et al,1986). The measures of external noise from each zone in the city, usually taking on account only the aspect of normal traffic, give an indirect idea of noise impact in citizens and were scored. Crash of external noise of explosions from surrounding ore mining were registered in some dwelling region. Internal measures in a home, from a lesser noisy region than mean, were showed, detecting occasional noises, which normally were not considered, in spite not focused any exceptional event. Population claims increase, following Militar Police and Ambiental City Secretary surveys. Similar noise pollution are probably occurring in many towns in Brazil. Peoples suffer and wait urgently from authorities and polititians actions and laws more effective to guard at least their remaining healths, to stop a worse tendency.
 

1) Resumo (Summary) sobre Poluição Sonora em Belo Horizonte: Os valores de ruídos urbanos, especialmente os internos de escolas e dum hospital, foram mostrados em Belo Horizonte. Eles já estavam fora-da-lei, infringindo a prescrição municipal 4034/85, decreto 5893/88, estavam longe de seguir as recomendações da ABNT e de proporcionar o conforto auditivo, entrando numa faixa perigosa de estresse sonoro (Cantrell, 1974; Organização Mundial da Saúde, 1980; Sapolsky et al, 1986). As medidas de ruídos externos de todas as zonas da cidade, usualmente só avaliando o aspecto normal do tráfego, dão uma idéia indireta do impacto do ruído no cidadão e foram registradas. Ruídos externos de explosão de mineradoras da periferia da cidade foram medidos em alguns bairros residenciais. Medidas de ruído interno de uma residência, numa região menos barulhenta que a média, é mostrada, detectando ruídos ocasionais, que normalmente não são considerados. apesar de não ter focalizado algum evento excepcional. Reclamações da população aumentam, segundo dados da Polícia Militar e Secretaria Municipal do Meio Ambiente. Poluição sonora semelhante deve estar ocorrendo em muitas cidades no Brasil. Pessoas sofrem e esperam urgentemente das autoridades e políticos atitudes e leis mais efetivas para resguardar ao menos o restante da saúde dêles, pois a tendência é piorar.
 

2) Metodologia sobre medição de Poluição sonora em Belo Horizonte

    Um amplo diagnóstico de todas as zonas da cidade foi realizado em 1988 (Alvares et al), usando a classificação da Lei do Uso e Ocupação do Solo, em pontos determinados pelos técnicos da Secretaria Municipal do Meio Ambiente (SMMA).

    Foram usados aparelhos Bruel & Kjaer, analisador de nível sonoro 2230, microfone e condensador 4155, calibrador 4230 e protetor de vento e tripé. Os dados foram processados num PC-Microtec, usando planilha Lotus 1.2.3 e um gerador de gráficos Chart.

    O Leq foi escolhido por representar melhor a exposição sonora em cada região, uma vez que leva em consideração a média das ocorrências sonoras num certo ponto (WHO, 1980). Também foram medidos L90, L10, Lmax e Lmin, usados segundo a necessidade.

    Nas medições observou-se uma distância mínima de 2 metros das fachadas, o afastamento de 20 metros do cruzamento e de semáforos, ausências de fontes de emissão sonoras atípicas, chuvas e ventos fortes. O horário da medição foi das 8 às 18 horas de 2a. a 6a. feiras, nas principais praças, proximidades de escolas, igrejas e casas de saúde. Nas diversas zonas foram escolhidos também pontos em vias expressas, artérias coletoras, locais e de pedestres segundo recomendação da ABES (1985). Em cada ponto foram realizadas 90 medições em intervalos de 10 segundos, durante 15 minutos, perfazendo um total de 153 pontos na cidade. Esse diagnóstico levou em consideração quase só o tráfego de veículos, sem interferência industrial, da comunidade em geral ou de outro ruído acidental.

    Caso não mencionada essa metodologia foi aplicada totalmente ou parcialmente em todos resultados de medições de ruído apresentadas a seguir.

3) Resultados e Discussão: A situação externa da Poluição Sonora nas vias urbanas em Belo Horizonte
A SITUAÇÃO EXTERNA NAS VIAS URBANAS

    O nível médio dos Leq de todas as zonas da cidade de Belo Horizonte foi de 69,5 dB(A) (Figura 1).

    A zona ZI (industrial) possuia um Leq=66,7 dB(A), no período diurno, surpreendentemente quase 3 dB(A) menor do que a média de toda a cidade, talvez por se encontrar em fase de implantação e mal aproveitada. Por ser o local, onde não se pertuba quase nada os cidadãos, pois lá não se fixam residentes, seria a região ideal para localizar as atividades mais barulhentas, como se faz em certos países avançados.

 
Figura 1: Nível médio de ruído em cada zona de Belo Horizonte, onde zc, zona comercial, zr, 
zona residencial e zi, zona industrial e Leq, uma média dos níveis de pressão sonora (WHO, 
1980).
    A média das 8 zonas residenciais tradicionais, previstas no Plano Diretor original de Aarão Reis, à qual se incorporaram mais alguns bairros da zona sul, considerados "nobres", foi de Leq=66,7 dB(A), exatamente igual a ZI, mostrando uma grande indefinição no planejamento atual da cidade.

    A ZR5, incluindo tradicionais bairros residenciais nobres da região centro-sul como Savassi, Funcionários, Lourdes e Santo Agostinho, possuia Leq=71,7 dB(A), portanto mais de 2 dB(A) acima da média. Entre as zonas exclusivamente residenciais a ZR1, incluindo bairros "nobres" da região norte, próxima ao Lago da Pampulha, acrescida à cidade há cerca de 50 anos, aparecia em melhor situação absoluta com nível de 61,0 dB(A)(Leq), para o período diurno, portanto 8,5 dB(A) menos do que a média.

    As 6 zonas comerciais incluem os bairros Renascença, Floresta, Santa Inês, Cruzeiro, Grajaú, Padre Eustáquio, Santa Branca, Santa Amélia, Venda Nova e Aeroporto da Pampulha, e partes de: Savassi, Funcionários, São Lucas, sem falar o centrinho propriamente dito, mostraram um Leq médio de 73,8 dB(A), portanto mais de 4 db(A) acima da média. No entanto, apesar de classificadas como comerciais, muitas dessas regiões são tipicamente residenciais e mereceriam melhor proteção.

    Os pontos mais graves da cidade foram as Avenidas Amazonas, Antonio Carlos, Pedro II, Cristiano Machado, Augusto de Lima, Paraná e Afonso Pena e Praças Sete e da Rodoviária, sem falar da BR-262 (Tabela 1). Alinham-se entre os mais poluidos do mundo, pois o Leq está acima de 79 dB(A), valor até o qual se incluem 21 pontos, correspondendo a 13,7% da amostra e se encontravam dispersos por toda a cidade, não respeitando mesmo Hospitais ou Escolas, mostrados entre parêntesis.

    Independentemente desta amostragem, que pretendeu cobrir toda a cidade, em 1982 já se mostravam outros pontos de Leq acima de 79 dB(A), que não foram estudados dessa vez, como o Viaduto Santa Tereza, 85 dB(A), e Av. Antônio Carlos em frente ao Hospital Belo Horizonte, 88,6 dB(A). Na Savassi houve até melhoria de 79 para 73 dB(A), devido a provável interdição de serviços locais de alto-falantes, cuja proibição de alvarás deveria se extender aos bairros (Álvares, 1982). Mas, a Praça Hugo Werneck, por exemplo é um ponto curioso, que resiste à queda da poluição sonora, onde se concentra 80% dos equipamentos hospitalares de Belo Horizonte, e mantem desde 1982 até hoje um nivel de cerca de 73 dB(A), confirmado ainda em 1991, apesar do desvio considerável do trânsito local.

 Tabela 1: Número de pontos (N=21) sobre 153, amostrados em Belo Horizonte, nas diferentes zonas de acordo com a Lei de Uso e Ocupação do Solo, que mostraram um nível de ruído (Leq)
mínimo de 79 dB(A) em 1988.
 

Ordem 

Leq-dB(A) 

LOCALIZAÇÃO 

1o. (N=1)  88 Av. Amazonas com BR-262
2o. (N=2) 82  Av. Antônio Carlos com BR-262
    BR-262, California.
3o. (N=3) 81  Av. Pedro II com Av. Carlos Luz 
    Av. Cristiano Machado, saída do tunel
    BR-262, Via do Minério.
4o. (N=6)  80 Praça Sete
    Praça da Rodoviária
    Av. Afonso Pena com Carandaí
    Av. Paraná com Tamoios
    Av. Cristiano Machado com BR-262 
    Av. Augusto de Lima (Casa de Saúde S.Sebastião)
5o. (N=9)  79  Av. Amazonas com Espírito Santo
    Av. Amazonas com Martin de Carvalho
    Av. Getúlio Vargas (Escola Bueno Brandão)
    Av. Bias Fortes com Curitiba
    Av. Antônio Carlos com Formiga 
    Rua Jacuí (Hospital S. Francisco)
    Rua Pe. Eustáquio (Igreja S. Fco. Chagas 
    BR-262, Av. D. João VI.
    Barreiro, Visc. Ibituruna.
 

    O ruído de trânsito de veículos automotores é o que mais contribue na poluição sonora. A engenharia de trânsito já possue fórmulas matemáticas e ábacos, que prevêm o nivel de ruído em propagação livre em função do fluxo de carros, que não param de crescer numericamente nas cidades, portanto tendendo a agravar a situação (CERNE, 1979). Pode-se esperar cerca de 78 dB(A) a 15 m, quando há um fluxo de 1.000 veículos/hora com carros tão barulhentos como os brasileiros. Os níveis sonoros tendem a se aproximar, quando o trânsito se equivale, por exemplo, quando se comparam vias de grande trânsito em São Paulo, Rio ou Belo Horizonte (ABES, 1985). Outras grandes cidades Brasileiras como Salvador, Recife, Porto Alegre etc, e até mesmo Curitiba, que apesar de algumas medidas urbanísticas, possue ainda pelo menos 4 pontos com mais de 90 decibéis (?) (Santana, 1991), tendem também a apresentar regiões que se igualam aos pontos críticos das três maiores metrópoles. Nessas metrópoles se encontram artérias despreparadas, cercadas com paredões arquitetônicos, trepidando de veículos automotores ultrapassados e pessoas inconscientes dos melefícios. Azevedo (1984) previa uma piora de 2 db(A) por ano no Rio. Se por um lado a topografia acidentada de Belo Horizonte agrava o ruído do trânsito, Rio e São Paulo continuam mais aglomeradas, emprisionando o ruído, e possuem um trânsito mais denso.

    Por outro lado, o Índice de Ruído de Trânsito (TNI, Griffiths & Langdon, 1968) foi calculado. Segundo seus criadores, o TNI tem a ver com valores medianos (L50), como também com L90 e L10 e é o mais adequado para a avaliação subjetiva do incômodo. Em Belo Horizonte os resultados obtidos são mostrados na Figura 2.

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Figura 2: Incômodo medido pelo índice de ruído de trânsito, TNI (Griffiths and Langdon, 
1968), onde zc, zona comercial, zr, zona residencial e zi, zona industrial.
    Alguns moradores da ZR1 (bairros nobres da Pampulha), embora convivendo com os valores mais baixos de ruído médio (Leq), tem potencialidades de ser mais incomodados com a variação do ruído, pois o seu valor TNI é o segundo mais alto, 108 dB(A). Aí deve-se também incluir as regiões afetadas pela rota aérea do Aeroporto da Pampulha, onde esses ruídos acidentais ficam fora das avaliações correntes. No entanto, as zonas ZR3, ZR4, ZR4A, ZR4B, ZR5 e ZR6 que possuem um Leq maior, têm um TNI menor, cerca de 95 dB(A), devido a um trânsito permanentemente mais intenso, possuindo valores de L90 e L10 mais próximos. Há portanto uma maior "adaptação" ao ruído, mas sem evitar seus lentos danos à saúde.

    Para reduzir o incômodo, segundo previsão usando o TNI, não basta limitar o valor médio absoluto do Leq, mas reduzir também a oscilação entre os valores L90 e L10. Paradoxalmente, o ruído de pequenas cidades no Brasil, na medida em que o ruído médio de fundo cai, pode incomodar mais do que os de maiores cidades, devido aos aparelhos e veículos, originários das mesmas fábricas, constituirem fontes emissoras da mesma potência.

    Para melhoria imediata da poluição sonora de no mínimo de mais de 5 dB(A) em média por toda a cidade se deveria fazer competente repressão aos infratores de carros e motos usados, condutores e vândalos excessivamente barulhentos, atividades boêmias e semi-industriais nas zonas residenciais e insonorizar todos os ônibus (CERNE, 1979). A médio prazo se poderia ganhar mais 10 dB(A) adotando-se normas europeias ou australianas com a fabricação de veículos automotores ou perdê-los se não adotarmos normas mais severas quanto ao urbanismo e arquitetura. Nossas ruas estão se tranformando em verdadeiras caixas acústicas e nossos prédios excelentes fontes e meios de transmissores de ruído (IPT, 1988; Gerges, 1991; Silva, 1991). Por isso, é urgente a adoção de Planos Diretor e de Uso e Ocupação do Solo para as grandes cidades, que contemplem todos esses aspectos. É incrível que não se entenda ainda no Brasil que é mais racional, barato e saudável descentralizar, construir e apoiar o desenvolvimento de pequenas cidades do que destruir e reparar mal os centros implodidos das grandes cidades, às vêzes com perdas históricas.

    Já não se pode confundir a cidade de hoje com a decantada Belo Horizonte dos anos 40-50, merecidamente chamada de "Cidade Jardim", com seus sóbrios 400 mil habitantes, que conviviam nas praças e ruas com um conforto auditível de 20 a 30 decibéis. Podia-se ouvir a natureza, se perceber, fazer suas próprias terapias de sonos curtidos, dedicar-se bem à atividade intelectual e desenvolver a reflexão. Naquela época reportava-se um nível máximo de 70 dB, contra 107 de hoje (Tabela 2). São 37 dB de diferença, que perfazem um aumento de mais de 4.000 vêzes de pressão sonora e algo semelhante em número de veículos, para somente uma aumento de 5 vêzes da população (Nava, 1958). A política de recuperação da qualidade de vida só será efetiva se for profunda, sem se perder em superficialidades, encarando os êrros da nova realidade e resgatando o possível, uma vez que a vida se degrada com mais facilidade do que se pode imaginar.

4) Resultados e Discussão: Ruídos de explosões na região sul de Belo Horizonte
    Além da metologia anterior, cumpriram-se normas especiais da ABNT sobre explosões para efetuaram medidas, provenientes de mineradoras situadas na vizinhança da região sul da cidade, bairros, considerados nobres, Belvedere, Mangabeiras e Sion em 1990 (Tabela 2). Em algumas residências do primeiro bairro é comum haver estilhaçamento de vidraças de janelas, pois o fogo primário as atinge com mais de 100 dB(C) e o secundário com quase com esse valor.
Tabela 2: Níveis de pressão sonora das detonações de bananas de dinamite medidas em áreas 
residenciais da região sul, onde o fogo primário é o usado no desmonte e o secundário para 
implodir blocos, que são previstos em duas séries por dia em cada mina num máximo de 6 
por dia, segundo a ABNT.
5) Resultados e Discussão: Ruído interno em algumas escolas da UFMG em Belo Horizonte
DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS (UFMG)
    A Lei Municipal Ambiental, que rege o controle da poluição sonora em Belo Horizonte, é a de número 4034/85, decreto 5893/88, que estabelece, entre outras coisas, níveis máximos de ruído internos para cada um dos 3 períodos: diurno (das 7 às 19 horas), vespertino (19-22h) e noturno (22-7h), de acôrdo com a lei do uso e ocupação do solo (Tabela 3).

 Tabela 3: Níveis máximos de pressão sonora, dentro dos limites reais da propriedade,
em decibéis acústicos, dB(A), onde: ZC-zona comercial, ZR-zona reidencial e ZI-zona industrial.
Obs.: Essa tabela complementa o art. 13 da lei no. 4034/85, decreto 5893/88, que além
disso dispõe que nenhuma fonte de ruído pode excedeer de 10 dB(A) o nível de fundo existente no local.
 
Zona de uso e ocupação 
do solo da propriedade
HORARIOS 
DIURNO 
VESPERTINO 
NOTURNO 
ZR1,ZR2 
55 
50 
45 
ZR3,ZR4,ZR4A,ZR4B,ZR5 
60 
55 
50 
ZR6,ZC1 
65 
60 
55 
ZC2,ZC3,ZC4,ZC5,ZC6,ZI 
70 
60 
60 
    Uma medição do ruído interno em algumas Escolas da UFMG, localizadas na zona central da cidade, com metodologia semelhante à anterior, aplicada a interiores, foi realizada em setembro de 1988 (Álvares, 1988).

    As medições internas realizadas nas Bibliotecas mostraram um Leq variando de 53,4 a 68,2 dB(A) (Figura 3) e nos Auditórios, Leq entre 51,1 dB(A) e 66,5 dB(A) (Figura 4). Somente quando o barulho ambiente se aproximava do nível de ruído mínimo era obedecida a Lei Ambiental, que no caso prescreve para Escolas valores iguais à ZR1. Poucas vêzes o nivel sonoro permitia conforto auditível, 50 dB(A), para seus usuários e quase sempre estavam bem acima do início do estresse, já em estado avançado (Cantrell, 1974; WHO,1980; Sapolsky et al, 1986).

 
Figura 3: Nivel de som contínuo equivalente nas Bibliotecas de algumas Escolas da UFMG, 
onde: círculos cheios indicam valor de Leq; L90 e L10 estão limitados pelas linhas hachuradas 
e Lmax e Lmin pelo retângulo.
 
 
Figura 4: Nível de som contínuo equivalente nos Auditórios de algumas Escolas da UFMG, 
onde: círculos cheios indicam valor de Leq; L90 e L10 estão limitados pelas linhas hachuradas 
e Lmax e Lmin pelo retângulo.
    Nos interiores da Biblioteca da Escola de Engenharia e do Auditório da Escola de Música os níveis de ruído chegavam a ultrapassar 80 dB(A) (Lmax), mostrando-se como lugares impróprios à reflexão, ao estudo, à pesquisa e à criação intelectual como se destinam, assim como os demais das outras escolas.

    Conclue-se então que o nível de ruído nessas escolas é crítico, pois além de não se seguir a Lei Ambiental, que está ainda aquém do ideal para a saúde, afasta-se muito dos valores recomendados pela ABNT (1987), que é de 35 a 45 dB(A) para esses locais. O infrator pincipal é o tráfego, aliado à permissividade dos órgãos ambientais e a falta de planejamento ecológico.

 6) Resultados e Discussão: Ruído interno no Hospital das Clínicas da UFMG em Belo Horizonte
    Foi realizada em setembro de 1991 uma medição do ruído interno em diferentes andares do Hospital das Clínicas da UFMG, blocos recém-construidos e só habitados logo depois, localizados em zona central da cidade, com metodologia semelhante à aplicada anteriormente nas Escolas da UFMG no horário das 9 às 11 horas, fora do pico do trânsito (Álvares, 1988).

    As medições internas realizadas no Hospital das Clínicas mostrou Leq variando de 63,2 a 68,4 dB(A), atingindo picos (Lmax) de 79,7 dB(A). Nos Centro de Tratamentos Intensivos (CTIs) o ruído, embora menor, sómente por alguns momentos, poderia seguir a Lei Ambiental, que em hospitais é igual a ZR1, a notar pelos valores mínimos de ruído (Lmin) (Tabela 4). Não se proporcionará em algum momento o conforto auditível, abaixo de 50 dB(A), para seus futuros pacientes traumatizados ou em risco de vida. Pelo contrário, ficarão quase sempre em estado de estresse bem avançado (Cantrell, 1974; WHO, 1980; Sapolsky et al, 1986).

Tabela 4 :Níveis de som em dB(A), medidos no interior da parte nova do Hospital das 
Clínicas da UFMG, quando ainda não ocupadas por pacientes.
LOCAL 
Lmax 
Lmin 
Leq(30 min) 
PEDIATRIA II 
(8o. andar - extremo do bloco)
78,2 
58,5 
68,4 
PEDIATRIA I 
(8o. andar - meio do bloco)
77,3 
59,3 
67,6 
PEDIATRIA III 
(8o. andar - centro do bloco)
77,0 
56,5 
66,6 
ENFERMARTIA I 
(4o. andar)
78,7 
57,5 
65,0 
CTI I 
(2o. andar - extremo do bloco)
79,7 
54,5 
65,8 
CTI II 
(2o. andar - centro do bloco)
75,5 
53,7 
63,2 
 

    O ruído nesse hospital vai continuar crítico, inclusive na ala nova, pois além de não se seguir a Lei Ambiental, que está aquém do ideal para a saúde, afasta-se muito dos valores recomendados pela ABNT(1987), que é de 35 a 45 dB(A) para esses locais. Apesar de já ter havido algum desvio de trânsito na vizinhança, essa região ainda concentra cerca de 20% do movimento de ônibus da cidade e que poderá vir a crescer após a abertura de trânsito sôbre extenso viaduto na região. Certamente o Relatório de Impacto Ambiental não deve ter considerado tal aspecto.

    O nivel de ruído é crescente à medida que se sobe os andares do prédio, na parte extrema dos blocos mais perto das pistas de rolamento (Tabela 4). Seria de se esperar o contrário considerando o distanciamento maior da principal fonte emissora, o trânsito local. Nossa explicação seria devido ao efeito de "cortinas acústicas" "não intencionais", de compactas árvores, em princípio ali colocadas mais por efeitos estéticos em décadas anteriores, e de tapumes de obras. Outra intensa fonte de ruído, a avenida dos Andradas, situada a algumas centenas de metros com um fluxo de veículos de alguns milhares por hora, é interceptada nos andares inferiores pela topografia e outras construções mais baixas. E finalmente, os CTIs são ambientes mais isolados do exterior. Na verdade as isolações e cortinas acústicas poderiam ser mais eficientemente projetadas, se fossem planejadas dentro de critérios técnicos de controle acústico (CERNE, 1979, Silva, 1991).

 

7) Resultados e Discussão: Ruído interno numa residência da zona sul em Bel Horizonte
METODOLOGIA
    Numa residência localizada na zona 4B, onde Leq=67,6 dB(A), cerca de 2 dB(A) abaixo da média da cidade (Figura 1), a segunda mais protegida pela Lei Ambiental (Tabela 3), e com o menor TNI=89 dB(A) (Figura 2), indicando menores variações sôbre o nível de ruído contínuo de fundo, os valores internos foram registrados. Sua localização é fora dos eixos movimentados de trânsito, sem passagem de linhas de ônibus, sem passagem para outros bairros e só com trânsito local. A residência fica a mais de 20 metros do cruzamento. Portanto, pode ser considerada mais privilegiada que a maioria das residências da cidade.

    O medidor de pressão sonora usado era da marca Realistic, Tandy Co., Corea, na escala A. O ruído foi medido do final do período diurno (17horas) até início do período noturno (23horas), domingo, 2a. e 3a. feiras, dias 19 a 22 maio de 1990, sem haver alguma atividade excepcionalmente barulhenta no prédio (festas, obras, "bricolagens", aparelhos de som ou TV abusivamente ligados como eventualmente pode ocorrer), na vizinhança ou no tempo meteorológico. As medições após as 22 horas foram apenas ocasionais. Usava-se uma técnica semelhante à anterior, nos quartos de frente para a rua. Não foram registrados todos os ruídos ocasionais, mas aqueles que ocorriam no período de amostragem de cerca de 10 minutos ou aqueles de intermitencia persistente, que se repetiam por alguns minutos.

RESULTADOS

    Até 18 horas e 30 minutos o ruído de trânsito repercutia muito no interior da residência, apresentando uma forte oscilação entre 55-81 dB(A) de acordo com o fluxo de carros (Figura 5). A partir daí, no período vespertino e início do período da noite, o nível subia a partir do ruído de fundo (40 dB(A) às 23 horas), em função da queda da frequência do trânsito, mas se mantendo naqueles dois limites, pois as fontes emissoras continuavam as mesmas. Isto significa uma oscilação ciclíca na queda de Leq e aumento de TNI. Observe que num caso se atingiu 95 dB(A) pela passagem de um carro com escapamento aberto. Essa relação sinal/ruído de fundo é mais do que suficiente para acordar a maioria das pessoas nos sonos profundos, cujos limiares nos estágios IV e paradoxal, o dos sonhos, são de 35 e 31 dB(A) respectivamante (Lukas, 1971). Os ruídos internos, no período vespetino e início do noturno, estavam mais abusivos do que os diurnos, em infração à Lei Ambiental, porque seu limite cai respectivamente de 5 e 10 dB(A), incomodando certamente muito mais devido à queda do ruído de fundo, ultrapassando o limite do saudável (Cantrell, 1974; WHO, 1980; Sapolsky et al, 1986) e afastando-se consideravelmente dos valores recomendados pela ABNT (1987), que estão entre 35 e 45 dB(A).

 
Figura 5: Nivel de pressão sonora, medida em dB(A), obtidos dentro de uma residência de 
zona sul em Belo Horizonte. As barras verticais indicam ruídos instantâneos pela passagem de 
veículos automotores, as mais altas referem-se a ônibus e caminhões pesados e as médias 
carros mais barulhentos (fuscão, kombi etc). Barras grossas: com seta, indicam buzinas ou 
barulhos de carros ou motos com escapamentos adulterados e, com círculos cheios, ruídos 
provenientes do prédio. Aquelas, interligadas e com intervalos preenchidos com finas barras 
verticais, indicam repiques intermitentes de bolas nos andares superiores. O fluxo de trânsito 
foi estimado em 30 carros/h (17h), 60 (18h), 30 (19h), 15 (20h) e 7 (22h).
 
 
Figura 6: Análise de fontes de ruído máximo instantâneo, no interiorde um apartamento do 
primeiro piso sobre o térreo, de frente para uma rua estreita duarante dois dias. Nas colunas 1 
(período da manhã) e 2 (períodos vespertino e noturno), ruidos do trânsito, Carro (C) e Moto 
(M). Na coluna 3, ruidos de Aceleração de motor (A) ou Buzina de carros no portão da 
garagem do prédio (B). Na coluna 4, ruidos de vizinhos como Pisotear (Pi), batida de Porta 
(Po), Som (S), Grito (G), Porta de Armário batendo (Pa), golpe de Descarga hidráulica (D), 
Vozerio (V) e Repique de bola no piso (R). Entre parêntesis consta o horário da ocorrência.
     Noutra análise das fontes de ruído máximo instantaneo, num domingo e 2a.-feira, dias 26 e 27 de maio de 1990, que foram dias relativamente mais tranquilos do que a maioria, sem algum evento excepcional. Os ruídos internos, medidos ao longo do dia, voltaram a se mostrar excessivos, sendo provenientes ou de atividades diversas dos moradores, de hábitos noturnos com poucos cuidados com o conforto ambiental dos vizinhos, ou do uso dos equipamentos do prédio e ou do trânsito noturno (Figura 6). Desde o levantar até a hora de dormir, incluindo o período de higiene do sono, a maioria das pessoas de hábitos diurnos provavelmente estão sendo agredidas no seu domicílio, pelo desrespeito ao nível ruído saudável e legal.

 

8) Reclamações da poluição sonora dos cidadãos de Belo Horizonte

    A pertubação pelo ruído constitue a maioria das queixas junto à SMMA (53% do total) e Polícia Militar (PM). O cidadão está baseado na lei municipal 4034/85, decreto 5893/88 e artigo 42 do código penal. O nivel absoluto excesssivo de ruído é prejudicial, mas a variação sobre o ruído de fundo às vêzes incomoda mais (Griffith & Langdon, 1968). As reclamações em BH cresceram tanto que acionar a PM (telefone 190) se tornou quase inútil (Figura 7). Recebem dezenas de chamadas diárias, só atendem algumas, quando se resumem a lavrar um ato de ocorrência para posterior ação da SMMA ou da Polícia Civil. Mas, essa última não está equipada commedidores de pressão sonora. Depois a SMMA pode designar um fiscal para medir o ruído, mas que já não existe mais. A maioria dos processos judiciários nem siquer começam. As reclamações diretas à SMMA estavam sendo bem menores, porque concentram-se no expediente diurno de dias úteis e era desconhecida sua forma de ação. Mas, dados recentes parecem indicar também um elevado aumento nas reclamações na SMMA, 300 por mês (EM, 1991) ou mais de 10 por dia (dado pessoal da SMMA), na medida que as pessoas fiquem sabendo que é mais eficaz. Os danos à saúde e ao trabalho não são acionados pela procuradoria e sua gravidade é subestimada pelos juizes, que estão desatualizados, assim como os próprios médicos, por ser um assunto de novidades científicas e ainda mal divulgados.

 
Figura 7: Número de reclamações da Poluição Sonora em Belo Horizonte nos últimos anos, 
dados fornecidos em A) por Queiroz (1991) e em B) por Dias (1991).
    Como a PM não está equipada com os medidores de pressão sonora, sua atuação costuma ser contestada pelos infratores, apesar de toda evidência. Assim a PM limita-se a solicitar a colaboração, apesar de poder inclusive fazer prisão por contravenção penal, por constituir pertubação do trabalho e sossego alheios, desde que apareça testemunha, que é raro diante da omissão do cidadão brasileiro. Partindo a PM, os agressores geralmente voltam cinicamente aos seus níveis de emissão de ruídos. Por se ver ineficaz a PM prefere geralmente se omitir, não atendendo a maioria desses chamados e limitando-se a outros flagrantes materiais, como crime, roubo etc. Devido a impunidade a infração à poluição sonora tende a aumentar. O trabalho insatisfatório realizado até o momento deteriora a imagem das instituições e categorias profissionais envolvidas. Mas, a PM é o único órgão que mantem regularmente plantão para reprimir a poluição sonora nas horas mais aflitivas de repouso, à noite e fins-de-semana, quando ocorre a maioria das transgressões.

    Os incômodos registrados pela SMMA podem ser distribuidos segundo a origem da fonte emissora (Figura 8), notando-se a predominância de pertubações de bares, restaurantes e locais de música ao vivo e de atividades semi-industriais, localizadas nas áreas industriais. Cerca de 50% das reclamações são provenientes de moradores da Administração Regional Centro-Sul (Queiroz, 1991), que possue um nivel externo de mais de 2 dB(A) do que a média da cidade.

 
Figura 8: Fontes originárias de reclamações de Poluição Sonora em Belo Horizonte, durante o 
ano de 1990 e parte de 1991, em porcento entre parêntesis.
 

    Pelos níveis médios de ruído medidos em Belo Horizonte os incômodos, só devido ao trânsito, TNI, devem estar provocando incômodo em cerca de 100% da população segundo estimativa de Ollerhead (1973) e chegariam a classificação de "elevado", em cerca de 50% da população segundo Schultz et al (1976). Por isso o nivel de reclamações junto à SMMA e PM, embora crescentes, estão ainda sub-avaliados e não indicam o verdadeiro grau de incômodo e danos causados à população.

9) Bibliografia sobre Poluição Sonora em Belo Horizonte

1. Cantrell, RW (1974). Noise, biochemical and sleep effects. The Laryngoscope, LXXXIV, 10(2 supl), 1-55.

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3. Sapolsky, RM; Krey, LC, McEwen, BS (1986). The Neuroendocrinology of stress and aging: the glucocorticoid cascade hypothesis. Endocrine Reviews, 7(3), 284-301.

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7. Alvares, PAS (1982). Relatório técnico de avaliação preliminar dos níveis de som e ruído de alguns logradouros de Belo Horizonte. CETEC-COPAM-FEAM, Belo Horizonte, 54p.

8.Santana, M (1991). Áreas com terminais de ónibus preocupam técnicos em Curitiba. Jornal "Folha de Londrina", 27 julho.

9. Azevedo, AV (1984): Avaliação e controle do ruído industrial. Confederação Nacional da Indústria, Rio, citado em Fischer, FM et al (1989). Tópicos da saúde do trabalhador. Hucitec, São Paulo, 239 p.

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11. IPT (Ed.) (1988): Tecnologia de Edificacões. PINI, São Paulo. 415-460 p.

12. Gerges, S (1991). Tecnologias de minimização e medição da poluição sonora no meio urbano. Seminário "Silêncio e Saúde". SMMA-ABES, Belo Horizonte, 25 junho

13. Silva, P (1991). Participação no "Seminário "Silêncio e Saúde". SMMA-ABES, Belo Horizonte, 25 junho

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16. ABNT (1987). Recomendações número NMBR/10152. Associação Brasileira de Normas Técnicas, Riode Janeiro.

17. Lukas, JS (1971): Relative frequency of five sleep stages and relative sensitivity to tones during the seep stages. American Industrial Hygiene Conference, Toronto, quoted from Chapon, A; Pachiaudi, G; Vallet, M (1972). Pertubation du sommeil par le bruit chez l'habitant. CERNE, Bron, 64p.

18. Queiroz, S (1991). Participação no "Seminário "Silêncio e Saúde". SMMA-ABES, Belo Horizonte, 26 junho.

19. Dias, Cel. ou Sobrinho, SJD (1991). Representante do Estado Maior da Polícia Militar no "Semin rio "Silêncio e Saúde". SMMA-ABES, Belo Horizonte, 26 junho.

20. EM (Ed.) (1991). Regionais não controlam a poluição em Belo Horizonte, Entrevista com Dr. S. Queiroz, Diretor de Controle Ambiental da SMMA. Jornal "Estado de Minas", 28 novembro.

21. Ollerhead, JB (1973). Noise: how can the nuissance be controlled? Appl. Ergon., 4(3), 130-138, quoted from WHO (1980).

22. Schultz, TJ; Galloway, WJ; Beland, D & Hirtle, PW (1976). Recommendations for changes in HUD's noise policy standards. Washington, DC, Department of Housing and Urban Development, quoted from WHO (1980).