São Paulo, quarta-feira, 30 de maio de 2001
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GENÉTICA

Britânico usa DNA para vincular clientes com uma das linhagens maternas da espécie; Brasil tem serviço similar

Internet oferece genealogia de várias Evas

 DA REPORTAGEM LOCAL

Todo mundo descende das 33 filhas de Eva. Para saber qual delas foi sua ancestral, tudo o que você precisa fazer, se tiver origem européia e acesso à internet, é raspar a bochecha com algodão e pagar um geneticista para que construa a sua árvore genealógica.
O geneticista é Bryan Sykes, da Universidade de Oxford, Reino Unido, que mapeia sequências de DNA para descobrir de onde vieram os seres humanos.
Ele lançou um serviço na internet (www.oxfordancestors.com) chamado MatriLine, que permite traçar as linhagens maternas de qualquer pessoa até uma das sete filhas de Eva. Esse é o nome que Sykes escolheu para as linhagens de DNA mitocondrial (o DNA presente nas mitocôndrias, as fábricas de energia da célula, que só é transmitido pela mãe) que se espalharam pela Europa a partir de 45 mil anos atrás -as datas ainda são discutíveis.
Um serviço parecido existe no Brasil desde o ano passado, fornecido pela empresa Gene, de Belo Horizonte (www.gene.com.br). Ele permite determinar de que parte do mundo vieram os genes de cada brasileiro.
Quem entrar no site da empresa de Sykes e pagar 150 libras (cerca de R$ 500) recebe um kit com uma espécie de cotonete para mandar amostras de DNA colhidas na mucosa bucal para análise.
"Há cerca de 33 grupos [filhas], se você pegar o mundo inteiro", disse o geneticista-empresário.
O serviço é inicialmente voltado para Europa e EUA, mas o site garante que pode descobrir as origens de qualquer pessoa. No caso de europeus, seriam sete as matriarcas genéticas, descritas no novo livro de Sykes, "As Sete Filhas de Eva", recém-lançado no Reino Unido. "Para trazê-las à vida, eu lhes dei nomes, de Úrsula, na Grécia, 45 mil anos atrás, a Jasmine, na Síria, 10 mil anos atrás."

Parente da múmia
O pesquisador britânico começou a analisar DNA de ossos humanos antigos no início da década. Em 1994, foi chamado para examinar restos congelados de um homem de 5.000 anos, aprisionado no gelo dos Alpes.
Isso o levou a pesquisar como os genes passam inteiros de geração a geração pela linhagem materna e o ajudou a localizar os ancestrais genéticos humanos. Pouco tempo depois, descobriu na Inglaterra uma mulher com a mesma sequência genética da múmia.
Estava aberto um filão de mercado. "Milhares de pessoas pediram para fazer um teste de DNA para descobrir de onde elas vêm", disse Sykes. "A maioria vinha dos EUA. Eu acho que a razão para o interesse é a redescoberta do fato de que nós temos uma história e de que os genes não são somente algo que é legado a você."
As filhas de Eva são linhagens recentes de um DNA mitocondrial fundador da espécie, batizado como "Eva" pelo geneticista americano Allan Wilson. Ela teria vivido em algum lugar da África há cerca de 150 mil anos, quando o Homo sapiens sapiens surgiu.
Para saber a que distância uma pessoa se encontra de uma dada filha de Eva, basta sequenciar (descobrir a ordem das letras químicas A, T, C e G do DNA) uma porção específica do DNA mitocondrial e compará-la a certos grupos de genes (haplogrupos) que servem de etiquetas para as populações modernas.
"Conhecendo a distribuição dos haplogrupos, você consegue estabelecer rotas de migração", disse à Folha o geneticista Fabrício dos Santos, da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais). Santos também estuda genealogia, só que usando outra ferramenta genética, o cromossomo Y, transmitido apenas de pai para filho.
Essa abordagem o levou a localizar o chamado Adão das Américas, em 1999. Foi ele também que elaborou o método de busca dos ancestrais paternos usado pela empresa Gene -que acha as origens paternas por R$ 350 e as maternas por R$ 400.
"Qualquer pessoa com uma formação boa em genética de populações consegue fazer esse trabalho", disse Santos. Se a iniciativa pegar nos EUA, o mercado dos ancestrais está só começando.


Com agências internacionais
 
 

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