Pesquisadores descobrem um peixe-boi híbrido
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Pesquisadores descobrem um peixe-boi híbrido

A análise do DNA, feita em colaboração com a UFPE, mostrou que o animal tem genes das espécies marinha e amazônica, ambas ameaçadas de extinção


por VERÔNICA FALCÃO


Todos os peixes-bois marinhos que vivem nos oceanários do Centro Mamíferos Aquáticos (CMA/Ibama), em Itamaracá, são completamente cinza, menos um: Poque, que tem uma mancha branca na barriga. A razão genética para a diferença, até então apenas uma suspeita, foi finalmente comprovada por pesquisadores da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Poque é, sim, um híbrido, fruto do cruzamento do peixe-boi marinho com o amazônico.


A análise do DNA do animal, feita em colaboração com a Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), mostrou que ele tem genes das duas espécies, ambas ameaçadas de extinção. É como uma mula, que nasce a partir da reprodução do jumento com a égua. Os pesquisadores só não sabem se, assim como o híbrido de eqüino com asino, Poque é estéril. “Provavelmente sim, mas apenas um espermograma poderia confirmar essa hipótese”, diz o geneticista Fabrício Santos, do Departamento de Biologia da UFMG.


Ele descobriu que os peixes-bois marinhos possuem 48 cromossomos, oito a menos que os amazônicos. “Isso é uma diferença enorme”, considera o geneticista, que tem financiamento da Fundação O Boticário de Proteção à Natureza. “Os humanos têm 46, enquanto os chimpanzés, 48. Qualquer pessoa, no entanto, diria que a espécie marinha e a amazônica são mais semelhantes entre si do que são o homem e o chimpanzé”, compara.


O marinho é um pouco mais claro que o amazônico, tem unhas na extremidade das nadadeiras e é denominado cientificamente de Trichechus manatus. Alcança quatro metros e meia tonelada. O amazônico é menor e não tem unhas, por isso é classificado como Trichechus inunguis. Os dois fazem parte da ordem dos sirênios, a mesma do peixe-boi africano, do da Flórida (EUA) e do dugongo, que vive no Pacífico.


A origem das duas espécies brasileiras, segundo o pesquisador, ocorreu há milhões de anos. Há duas hipóteses para o surgimento delas. Uma, mais antiga, sugere que elas divergiram há cerca de 25 milhões de anos, quando a Amazônica era um grande lago de água salgada e passou a ser um rio depois da subida dos Andes, separando os dois tipos de peixe-boi. A outra, mais recente, situa o fato entre três e quatro milhões de anos atrás, como o resultado da adaptação de um grupo de peixes-bois marinhos à água doce.


Hoje há mais peixes-bois amazônicos que marinhos. Enquanto a população do peixe-boi marinho, que habita a costa do Norte e Nordeste do Brasil, é de aproximadamente 500 animais, a do amazônico é, pelo menos, dez vezes maior. Essa diferença também se reflete na genética das duas espécies. A amazônica tem uma variabilidade genética maior.