EVOLUÇÃO DO COMPORTAMENTO
Francisco Ângelo
Coutinho
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O estudo da evolução do
comportamento é tão antigo quanto o próprio darwinismo.
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Darwin enfrentou esse problema em Origem
das Espécies, A descendência do homem e A expressão
das emoções no homem e nos animais.
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Na década de 1930, Konrad Lorenz,
Niko Tinbergen e Karl von Frisch fundam a Etologia.
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O estudo evolutivo do comportamento
não se reduz aos mecanismos do comportamento mas, sobretudo, estuda
sua função adaptativa e seu desenvolvimento filogenético.
COMPORTAMENTO COMO FENÓTIPO
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Do ponto de vista da biologia evolutiva,
as características comportamentais são como qualquer outra
classe de caracteres.
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Os comportamentos exibem variações
genéticas e não genéticas, diferenças entre
populações e espécies.
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Os comportamentos são sujeitos
a evolução por seleção natural.
1. Variação nos Traços
Comportamentais Dentro da Espécie
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Instinto: comportamentos que
aparecem em forma completamente funcional na primeira vez que eles são
executados (Alcock1998). Supõe-se que eles sejam determinados geneticamente.
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Aprendizagem: modificações
de um comportamento em resposta a experiências específicas.
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Essa dicotomia é simplificada.
A expressão de uma característica comportamental pode variar
entre genótipos, e dentro de um genótipo ela pode variar
devido a variações na experiência prévia (aprendizagem)
e a outros fatores ambientais. Ou seja, o genótipo pode variar
a extensão na qual ele se expressa em resposta a aprendizagem ou
a outros fatores.
2. Diferenças Entre Espécies
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Diferenças entre comportamentos
típicos de espécies têm bases genéticas. Em
muitos casos, existe pouco ou nenhuma oportunidade de aprendizagem.
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Em alguns casos, no entanto, comportamentos
se espalham através da população como aprendizagens
individuais ("Culturalmente Herdados"). Exemplo, algumas espécies
de pássaros só aprendem o canto típico de sua espécie
ouvindo-o quando jovens.
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Alguns comportamentos de uma espécie
podem ser modificados pela aprendizagem.
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As espécies diferem naquilo que
pode ser modificado (Ex., gato e cão).
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A extensão na qual o comportamento
de uma espécie pode ser apreendido parece ser adaptativo. P. ex.,
o pássaro Nucifraga columbiana estoca sementes em
centenas de lugares e, assim, possui uma grande habilidade para aprender
e recordar localizações.
ESTUDO DO VALOR ADAPTATIVO DO COMPORTAMENTO
O estudo contemporâneo do comportamento
consiste no desenvolvimento e teste de hipóteses preditivas sobre
seu valor adaptativo.
Princípios Gerais:
1. Descrições
Teleológicas e Antropomórficas na Descrição
do Comportamento.
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Na literatura encontramos expressões
como "com o objetivo de", "estratégia", "decisão", "conflito",
"egoísmo", "engano", "trapaça", "altruísmo" , etc.
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No entanto, devemos ter em mente essas
expressões não descrevem consciência, previsão
ou propósito no comportamento animal individual, muito menos do
processo evolutivo que moldou o comportamento.
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A linguagem antropomórfica que
nós usamos é simplesmente uma maneira econômica de
descrição.
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Exemplo: "um ato comportamental que,
na média, causa um maior fitness reprodutivo para o ator do que
comportamentos alternativos que, na média, aumentariam o fitness
de outros indivíduos" = "comportamento egoísta".
2. Níveis de Seleção
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A moderna teoria da evolução
do comportamento adaptativo procura explicações exclusivamente
na seleção natural entre genes ou organismos individuais
dentro de uma população.
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Ou seja, não se invoca a seleção
de grupos (entre populações). O modelo de seleção
de grupo é instável.
EXEMPLOS DE COMPORTAMENTOS QUE TÊM
SIDO ESTUDADOS
1. SELEÇÃO SEXUAL
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Conceito: A vantagem que certos
indivíduos possuem sobre outros do mesmo sexo e espécie somente
com respeito à reprodução.
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Seleção sexual foi a solução
encontrada por Darwin para o problema de caracteres conspícuos tais
como cores brilhantes, chifres e disputas entre machos.
Figuras 1 e 2. Exemplos de
evolução de caracteres conspícuos entre indivíduos
da mesma espécie e sexos diferentes.

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Darwin propôs dois tipos de seleção
sexual:
a) disputas entre machos por acesso
às fêmeas (seleção intra-sexual) e
b) preferência das fêmeas
por um dado fenótipo (seleção intersexual).
A) Seleção Intra-sexual.
Disputa entre machos por acesso às fêmeas ou por sítios
favoráveis de acasalamento.
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A seleção intra-sexual
pode favorecer aumento no tamanho, desenvolvimento de "armas de combate".
Figura 3. Note o rostro extremamente
alongado do macho.
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Seguro de Paternidade e Competição
de Espermas:
Estratégias utilizadas por machos
no sentido de reduzirem a probabilidade de outros machos fertilizarem a
parceira.
Táticas comuns incluem:
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Territorialidade
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Vigilância da Fêmea.
Ex., macho permanece montado na fêmea até os ovos serem fertilizados,
como em muitos sapos, crustáceos e insetos.
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Tampão copulatório.
Prevenir subseqüente acasalamento (Essa tática ocorre em algumas
espécies de Drosophila, cobras e outros animais com fertilização
interna).
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Competição de espermas.
Ocorre quando a fêmea cruza com vários machos. (Tática:
produção de mais espermas, p. ex.)
B) Preferência das fêmeas
(seleção inter-sexual).
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Fêmeas de muitas espécies
cruzam preferencialmente com machos que possuem caracteres exagerados,
tais como padrões de cor, ornamentos, vocalização
etc.
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Esse fenômeno apresenta um dos
mais difíceis e controversos problemas da biologia evolutiva.
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Por que as fêmeas deveriam ter
uma preferência por caracteres exagerados, especialmente aqueles
perigosos para os machos que os possuem?
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Hipóteses:
I) As fêmeas escolheriam machos
com características distintivas para evitar o cruzamento com outras
espécies, produzindo híbridos não aptos. (Pouca evidência
para essa hipótese)
II) Hipóteses da Seleção
Sexual Fugitiva (runaway). A evolução de traços
masculinos e a preferência da fêmea, uma vez iniciados, tornam-se
um processo de alto-reforço virtualmente sem limites.
As fêmeas prefeririam machos
exagerados não porque esses forneçam genes que irão
favorecer a sobrevivência ou a fecundidade dos descendentes, mas
meramente porque as filhas de machos exagerados tenderão a preferir
machos com aquelas características.
Assim, a evolução da
preferência da fêmea não é um processo adaptativo.
III) Hipótese dos Indicadores
de Qualidade Genética.
Segundo esse modelo, as fêmeas
deveriam escolher machos com alta qualidade genética.
As características exageradas
seriam indicadores de boas condições fisiológicas,
boa resistência a parasitas, etc.
Por que existe seleção
sexual?
Trivers 1972. O alto investimento da
fêmea a torna mais seletiva. O macho não tem seu fitness
diminuído por copular com parceiros impróprios.
2. EVOLUÇÃO
DA COOPERAÇÃO
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Devido ao fato da seleção
natural estar baseada sobre as vantagens individuais, o egoísmo
deveria aumentar em freqüência.
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Assim, interações de cooperação,
nas quais indivíduos aparentemente conferem benefícios a
outros, deveria ser antitética com a evolução por
seleção natural.
Teorias da Cooperação
e Altruísmo
Normalmente, esses outros indivíduos
são parentes. Por isso essa teoria é também conhecida
como "seleção por parentesco".
Ex.: Cuidado Parental.
Regra de Hamilton: c < rb
ou seja, uma característica
selecionada por parentesco pode aumentar sua freqüência se o
custo do caráter ao seu portador em termos de valor adaptativo individual
(c) é menor que o benefício em valor adaptativo dispensado
aos parentes (b), ponderado pelo coeficiente de parentesco (r) entre doador
e o beneficiário da ação.
Nível de Seleção
Para Seleção Por Parentesco: o Gene (Dawkins, 1989).
Evidências de Seleção
Por Parentesco
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Reconhecimento de Parentes e Canibalismo
Exemplo. A salamandra tigre (Ambystoma
tigrinum): Canibal, porém distingue diferentes níveis
de parentesco e come parentes com menos freqüência.
Em pelo menos 220 espécies de
pássaros, os filhotes são criados não somente por
seus pais, mas também por outros indivíduos.
Esses ajudantes (helpers) são
parentes.
Probabilidade maior da sentinela dar
alarme quando são parentes intimamente relacionados.
Hymenoptera (abelhas, formigas e vespas)
possuem um sistema de determinação do sexo chamado Sistema
haplodiplóide: os machos são haplóides e as fêmeas
são diplóides.
Os machos se desenvolvem a partir
de óvulos não fertilizados (ou seja, não têm
pai) e fêmeas se desenvolvem de óvulos fertilizados.
Isso significa que as irmãs
compartilham todos os genes do pai e metade dos genes da mãe.
Como resultado, as fêmeas são
mais relacionadas às suas irmãs do que à sua própria
prole r = (1 X ½) + (½ X ½) = ¾ .
A relação com a própria
prole seria r = ½.
Portanto, é mais vantajoso
cuidar das irmãs do que da própria prole.
O PAPEL DO COMPORTAMENTO NA EVOLUÇÃO
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A especiação é
afetada pela tendência à dispersão, que afeta o fluxo
gênico entre populações.
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A especiação é
afetada por comportamentos de acasalamento, que podem conferir isolamento
pré-zigótico.
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A especiação é
afetada por usos do hábitat, alimentos e outros recursos, que podem
afetar a taxa de divergência genética e fenotípica
e conferir isolamento ecológico.
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Em virtude de seus comportamentos, os
seres vivos não são meramente objetos passivos expostos aos
agentes externos de seleção (ambiente).
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O comportamento pode iniciar mudanças
no nicho ecológico e, assim, ser um fator chave na diversidade animal
(Mayr, 1960, 1963).
Questões:
1. Assuma
que, para um pássaro individual, o risco de predação
diminui quando ele se liga a um bando maior, mas que sua disponibilidade
de alimento diminui com o aumento do tamanho do bando. Você pode
inventar um modelo que prediga quando se torna vantajoso sair do bando
e ligar-se a um outro menor?
2. O campo
da psicologia experimental inclui estudos de animais não-humanos
como modelos para a compreensão da percepção, aprendizagem
e outros aspectos do comportamento humano. Discuta como a perspectiva da
biologia evolutiva pode contribuir para esse campo e para as implicações
que podem ser tiradas sobre humanos de modelos animais.